“Um dia hás-de conquistar o universo.”
Sempre que a ouvia dizer isso, tremia. Tinha sonhos enormes, sim. Queria
voar e o universo parecia-lhe a medida perfeita para a sua ambição. Às
vezes acordava cheio de entusiasmo, convencido que era capaz de levar
tudo à frente. Outras vezes desanimava. Pequeno. Perdido. Confuso.
Frágil. Dois em um, indeciso no caminho a seguir.
“Um dia hás-de
conquistar o universo.” Fechava os olhos e sempre que ficava em silêncio
ouvia. De tanta insistência, decidiu: tinha de tentar. Ia encontrar a
fórmula certa. Fechou-se no laboratório e aquele tornou-se o seu maior
objetivo. Mal dormia, pouco comia, trabalhava incessantemente. Era uma
questão de insistir, acreditava. Rabiscava fórmulas, afinava
ingredientes, tomava notas e continuava a planear de forma metódica
aquilo que queria.
Às vezes desanimava – eram os dias em que o seu
lado mais sombrio dominava e o deixava paralisado. Nessas alturas
julgava perder-se. Olhava as notas e pareciam-lhe apenas traços confusos
e erráticos. Não conseguia descodificar o seu próprio caminho, trilhado
com tanto esforço. A falta de memória chegava a assustá-lo. Era como se
um só dia bastasse para perder as aprendizagens de longas semanas.
Cambaleava, tremia, mas recusava-se a cair. Ouvia ainda e sempre a voz
dela, acompanhada de um sorriso todo ternura. “Um dia hás-de conquistar o
universo.” E voltava a acreditar, de novo recordado de quem era. Força
luz ambição trabalho carinho sorriso: amor. Levantava-se renovado e
voltava a pegar nos tubos, produtos químicos, cálculos e fórmulas.
Trabalhava energicamente, seguro de si.
Até que um dia, quando se
julgava perto de desvendar o segredo, perto da meta, à beira de
conseguir a chave para conquistar o mundo inteiro, a conjugação errada
de componentes causou uma forte explosão. O laboratório desfez-se em
cinzas. Raios assustadores rasgaram-lhe o dia. As palavras terminaram:
vazio sem fim.
Deixou-se ficar quieto, a sentir cada dor que lhe
marcava a pele, os músculos, a vida e a alma. Não soube quanto tempo
durou a apatia nem como foi que a luz chegou. Como um pó mágico que as
fadas espalham sobre as pessoas – mesmo sobre aquelas que não acreditam.
Como um milagre que resgata das cinzas aqueles que se julgam à beira do
fim. Como um sorriso maior que a vida, capaz de varrer dúvidas, medos e
cobardia. A luz envolveu-o devagar, abraçou-o, limpou-lhe o olhar e
varreu pacientemente as sombras, uma por uma. E ele viu, com a clareza
que o seu lado mais sombrio nunca tinha deixado ver, que o universo
inteiro estava dentro de si.
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