02/01/2016

Universo Particular

“Um dia hás-de conquistar o universo.” Sempre que a ouvia dizer isso, tremia. Tinha sonhos enormes, sim. Queria voar e o universo parecia-lhe a medida perfeita para a sua ambição. Às vezes acordava cheio de entusiasmo, convencido que era capaz de levar tudo à frente. Outras vezes desanimava. Pequeno. Perdido. Confuso. Frágil. Dois em um, indeciso no caminho a seguir.
“Um dia hás-de conquistar o universo.” Fechava os olhos e sempre que ficava em silêncio ouvia. De tanta insistência, decidiu: tinha de tentar. Ia encontrar a fórmula certa. Fechou-se no laboratório e aquele tornou-se o seu maior objetivo. Mal dormia, pouco comia, trabalhava incessantemente. Era uma questão de insistir, acreditava. Rabiscava fórmulas, afinava ingredientes, tomava notas e continuava a planear de forma metódica aquilo que queria.
Às vezes desanimava – eram os dias em que o seu lado mais sombrio dominava e o deixava paralisado. Nessas alturas julgava perder-se. Olhava as notas e pareciam-lhe apenas traços confusos e erráticos. Não conseguia descodificar o seu próprio caminho, trilhado com tanto esforço. A falta de memória chegava a assustá-lo. Era como se um só dia bastasse para perder as aprendizagens de longas semanas.
Cambaleava, tremia, mas recusava-se a cair. Ouvia ainda e sempre a voz dela, acompanhada de um sorriso todo ternura. “Um dia hás-de conquistar o universo.” E voltava a acreditar, de novo recordado de quem era. Força luz ambição trabalho carinho sorriso: amor. Levantava-se renovado e voltava a pegar nos tubos, produtos químicos, cálculos e fórmulas. Trabalhava energicamente, seguro de si.
Até que um dia, quando se julgava perto de desvendar o segredo, perto da meta, à beira de conseguir a chave para conquistar o mundo inteiro, a conjugação errada de componentes causou uma forte explosão. O laboratório desfez-se em cinzas. Raios assustadores rasgaram-lhe o dia. As palavras terminaram: vazio sem fim.
Deixou-se ficar quieto, a sentir cada dor que lhe marcava a pele, os músculos, a vida e a alma. Não soube quanto tempo durou a apatia nem como foi que a luz chegou. Como um pó mágico que as fadas espalham sobre as pessoas – mesmo sobre aquelas que não acreditam. Como um milagre que resgata das cinzas aqueles que se julgam à beira do fim. Como um sorriso maior que a vida, capaz de varrer dúvidas, medos e cobardia. A luz envolveu-o devagar, abraçou-o, limpou-lhe o olhar e varreu pacientemente as sombras, uma por uma. E ele viu, com a clareza que o seu lado mais sombrio nunca tinha deixado ver, que o universo inteiro estava dentro de si.

Sem comentários:

Enviar um comentário